Um relatório elaborado pelos promotores do Grupo de
Atuação Especializado no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) indica, por
exemplo, que o hospital pagou R$ 18,10 na compra de agulhas descartáveis
cujo valor de tabela não passa de R$ 0,35 por unidade.
As supostas fraudes detectadas pelos investigadores não
se limitam aos preços dos materiais, mas também às quantidades. Em uma única
internação de quatro dias, o relatório sustenta que foram faturados 68 equipos
macrogotas — usados para a administração de soluções intravenosas — para um
paciente.
Para efeito de comparação, o MP cita parecer do Conselho
Regional de Enfermagem do Pará que recomenda troca do material apenas a cada 24
horas. Para essa internação, deveriam ter sido utilizadas apenas quatro
unidades.
Um processo contra o prefeito corre em segredo de Justiça
e teve sua íntegra obtida com exclusividade pela CNN.
À reportagem, ele rechaçou a acusação do MP, que chamou
de “completamente descabida”, e se disse vítima de “prática persecutória” no
estado.
Segundo o Gaeco, as fraudes e os desvios ocorreram entre
2018 e 2022, quando Dr. Daniel — nome de Barbosa nas urnas — ainda era sócio do
hospital.
Nesses anos, o lucro líquido do Santa Maria aumentou
838%, saltando de R$ 3 milhões para R$ 108,5 milhões, conforme o MP.
O prefeito deixou a sociedade em 2022. Mesmo assim, teria
continuado no controle financeiro do hospital, segundo depoimento de uma
ex-diretora do Instituto de Assistência ao Servidor Público do Estado do Pará
(Iasep), autarquia que garante assistência médica aos servidores estaduais e
seus dependentes.
No interrogatório de 20 minutos, também obtido pela CNN,
a ex-gestora Josynelia Tavares Raiol disse aos promotores que Dr. Daniel foi ao
instituto, assim que ela assumiu o cargo, para se apresentar e tratar de
“assuntos de pagamentos”.
De acordo com Josynelia, o político se apresentou como
dono do hospital, que recebe parte do orçamento de verba pública e outra parte
de compensação do Iasep. “Sempre que tinha problema, era ele quem resolvia”,
declarou a ex-gestora ao Ministério Público.
Ela contou também que, desde sua entrada na direção do
instituto, percebeu valores superfaturados e faturas muito altas comparadas com
os outros hospitais da região.
● DESVIOS EM SERINGAS E BOMBAS - O relatório do MP também aponta o uso de quantidade “descomunal” de equipamentos pelo HSMA — desde materiais mais simples, como seringas, até bombas de infusão em leitos de UTI.
O esquema investigado pelo MP consistia no suposto desvio
de verbas do Iasep, plano de saúde dos servidores do estado e seus dependentes,
para o hospital em Ananindeua.
Uma denúncia anônima apontou que as fraudes em pagamentos
teriam começado em 2019 e se prolongado até 2023, quando quatro servidores
responsáveis pelo sistema de fiscalização do Iasep foram demitidos.
A investigação contra o prefeito, uma das estrelas em
ascensão na política paraense e pré-candidato declarado ao governo do estado em
2026, teve início em maio de 2024.
Conforme decisão do Tribunal de Justiça do Pará, o Ministério
Público sustenta que há “indícios de envolvimento” de Dr. Daniel.
“Trata-se de pessoa sobre a qual paira fundada suspeita
de associação aos demais investigados — identificados como figuras diretamente
operantes no esquema fraudulento, em hierarquia cuja topografia indica o
Prefeito de Ananindeua/PA como pessoa supostamente determinante para o sucesso
dos empreendimentos ilícitos”, diz a decisão, que autorizou a abertura de
procedimento investigatório criminal.
No mês passado, a defesa de Dr. Daniel pediu ao Superior
Tribunal de Justiça (STJ) a suspensão e o trancamento do processo com o
argumento que o prefeito foi citado “apenas por uma testemunha”.
O ministro Sebastião Reis Júnior, relator do caso,
rejeitou o pedido e mandou que a investigação tenha continuidade.
“No presente caso, há indícios da prática criminosa e
aparente justa causa para o procedimento investigatório instaurado”, sustentou.
Para o ministro do STJ, “resta evidente que o
procedimento investigatório criminal não foi instaurado exclusivamente com base
em um único depoimento, havendo indícios de superfaturamento de preços cobrados
por prestadores, e investigação pormenorizada de dados entre diferentes
hospitais atendidos pelo IASEP, demonstrando vestígios de materialidade delitiva
na administração das contas do Hospital”.
Com base nessa investigação e no depoimento da
ex-diretora da autarquia, o relatório do Gaeco diz ter indícios de envolvimento
do prefeito como autodeclarado “dono” do hospital, cuja administração se
encontra sob investigação.
●
OUTRO LADO - Em nota à CNN, a prefeitura de Ananindeua rechaçou a
conclusão do Ministério Público. “É completamente descabida e ausente de provas
a tentativa de associação, produzida pelas instituições estaduais, dos supostos
fatos ao prefeito”, afirma a nota.
“O depoimento mencionado [de Josynelia] é antigo e já foi
noticiado localmente no bojo da prática persecutória da imprensa no estado, em
que governantes, instrumentalizando seu aparato midiático e institucional, se
acham reis e donos do Pará”, continua a manifestação de Dr. Daniel, por meio de
sua assessoria.
“O prefeito reafirma estar à disposição da Justiça,
pedindo celeridade na apuração dos fatos, principal intenção dos recursos
interpostos.” (Fonte: CNN-Brasil - Daniel
Rittner e Elijonas Maia
da CNN, em Brasília)
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