Nos pouco mais de seis minutos entre que sair de seu
gabinete e recuperar o comando da Casa, ele ameaçou recuar, foi afastado para o
fundo da mesa do plenário pelo empurra-empurra e demonstrou claro
constrangimento após, enfim, ser praticamente jogado de volta na cadeira de
presidente por aliados.
Em seu caminho encontrou uma barreira, a recusa de
deputados de se levantarem de seu posto, a suspeita de um deputado armado e até
um bebê de colo no meio de um pelotão de cerca de 70 pessoas que se
aglomeravam, gritavam e se empurravam no pequeno espaço.
O fim do motim de deputados que protestavam contra prisão
domiciliar de Jair Bolsonaro foi costurado pelo ex-presidente da Câmara Arthur
Lira (PP-AL) com a oposição, mas o desfecho acabou saindo do script.
De acordo com o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), o
trato era Hugo Motta deixar o gabinete e reassumir a sua cadeira apenas quando
todos os amotinados descessem da mesa para o plenário.
O presidente da Casa tinha dito aos deputados ter como
ponto de honra a realização da sessão às 20h30. Acabou decidindo fazer o curto
percurso entre seu gabinete e a cadeira de presidente quando o relógio já
passava das 22h.
A imprensa, que havia sido barrada pela Polícia
Legislativa de entrar no plenário amotinado, acabou liberada para acompanhar o
desfecho das galerias do plenário.
Ao surgir na saída do seu gabinete —que tem acesso
direito ao plenário—, e tentar subir as escadas para acessar a mesa, o
presidente da Câmara foi barrado pelo bolsonarista Zé Trovão (PL-SC), de terno
e com o costumeiro chapéu de caubói. Trovão ficou postado ali, com uma perna
como entrave.
Foi preciso o apelo de Motta, de deputados e de um
policial legislativo que o acompanhava para Trovão dar passagem.
Sóstenes disse que veio dele a ordem para o
correligionário se postar na escada e impedir a passagem do presidente, já que
queria evitar um mal maior. Trovão afirmou que estava ali para evitar a ameaça
de que a Polícia Legislativa fosse usada para retirar os parlamentares à força.
De acordo com pessoas que acompanharam o tumulto de
perto, havia rumores até de que algum deputado bolsonarista estivesse armado.
Apesar de a Folha ter ouvido esse relato de várias fontes de informação, a
assessoria de Motta disse não ter chegado a ele essa suspeita.
Após se desvencilhar de Trovão, Motta foi parado por
Sóstenes, que lhe pedia calma. Ele seguiu adiante e chegou, em meio ao
empurra-empurra, à cadeira da presidência, mas não conseguiu sentar.
Lá estava Marcel van Hattem (Novo-RS), que dali se
recusou a sair. Outro que também resistia a sair da Mesa Diretora era Marcos
Pollon (PL-MS).
“Tinha sido combinado que a gente ia conversar com os
deputados e depois voltaríamos no [gabinete do] Hugo para conversar o que tinha
sido acertado com os líderes. Estávamos ainda discutindo a proposta quando ele
chegou de surpresa, digamos assim, e isso gerou mal-estar em vários colegas”,
diz van Hattem.
Logo ao lado estava a deputada Júlia Zanatta (PL-SC), que
chegou a levar sua filha de quatro meses para o meio da confusão —cujos
decibéis eram elevados pelos cântigos religiosos gritados pelo deputado Pastor
Sargento Isidório (Avante-BA).
Enquanto bolsonaristas, como Marco Feliciano (PL-SP),
conversavam e tentavam convencer a dupla a ceder, Motta ia sendo afastado pelo
empurra-empurra para o fundo da mesa.
Passados alguns momentos, Motta ordenou que policial
legislativo que o acompanhava abrisse caminho de volta ao seu gabinete. Ele
iria recuar e a movimentação aparentou colocar em desespero tanto aliados
quanto bolsonaristas, que ficariam mais ainda sob risco de terem os mandatos
suspensos como punição (nesta quinta, o presidente da Câmara disse que estuda
as imagens para definir punições).
Após dar alguns passos de volta ao gabinete, Motta foi
puxado pelo deputado Hélio Lopes (PL-RJ), que prometeu retirar os amotinados da
mesa.
Do outro lado, os deputados Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), Elmar
Nascimento (União-BA), Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL), Doutor Luizinho (PP-RJ) e
Pedro Campos (PSB-PE) passaram a empurrá-lo em direção à cadeira da
presidência.
No meio do caminho, voltou a encontrar van Hattem, que
dessa vez estava de pé, e aparentou ter uma conversa de poucos segundos nada
amistosa com ele.
Foram cerca de seis minutos. E, enfim, o presidente da
Câmara conseguiu sentar na cadeira que estava obstruída havia 30 horas.
Motta, que tem 35 anos, é o presidente mais jovem a
comandar a Câmara.
O motim bolsonarista, que incluiu não só os seis minutos
que abalaram sua gestão, mas a necessidade de intervenção do antecessor e
padrinho de sua candidatura, Arthur Lira (PP-AL), levou parlamentares a
avaliarem que sua liderança saiu fragilizada.
Até mesmo aliados dizem que essa operação para sentar na
cadeira da presidência foi mal executada por Motta, que titubeou e quase
recuou. Nas palavras de um deles, se o presidente da Câmara tivesse voltado
para seu gabinete naquele momento, corria risco de perder totalmente sua
legitimidade à frente da Casa.
Em seu discurso logo após retomar o posto, Motta disse
que a sua presença era para garantir ” a respeitabilidade desta mesa, que é
inegociável” e para que “a Casa possa se fortalecer”. “O que aconteceu nessa Casa
não foi bom, não foi condizente com nossa história. […] O que aconteceu ontem e
hoje não pode ser maior do que o plenário”, afirmou.
(Fontes: Ranier Bragon, Raphael Di Cunto e Victoria
Azevedo/Folhapress)

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